Se for acolhido o despacho do Ministério Público Eleitoral, que pede a cassação de mandatos e a suspensão dos direitos políticos da prefeita Adriane Nogueira Lopes (PP) e de sua vice Camila Nascimento de Oliveira (Avante), Campo Grande (MS) viverá um dos maiores escândalos políticos de sua história. As duas parceiras de chapa e ideologia foram denunciadas por compra de votos e outras práticas criminosas previstas na legislação.

Um entendimento compartilhado por grande parte de quem frequenta os principais ambientes políticos — como a Câmara Municipal, a Assembleia Legislativa e a Governadoria — é que a manifestação do Ministério Público está bem sustentada pelos documentos e fortes indícios reunidos pelo procurador-geral eleitoral Luiz Gustavo Mantovani. E seu parecer acaba de ganhar um reforço vigoroso, com o desfecho de uma denúncia semelhante que resultou na punição de dois gestores catarinenses.

Em Belmonte (Santa Catarina), a Justiça Eleitoral acolheu o pedido do Ministério Público Eleitoral e cassou os mandatos do prefeito e do vice-prefeito reeleitos, Jair Antonio Giumbelli (PL) e Cleonir Luiz Píton (MDB). Em uma Ação de Investigação Judicial Eleitoral, foram denunciados por abuso de poder econômico e compra de votos na eleição de 2024. Além da perda dos mandatos, ficaram inelegíveis por oito anos e foram condenados a pagar multas individuais de R$ 8 mil e R$ 10 mil, respectivamente.

Assim como o MPE de Mato Grosso do Sul, o MPE catarinense baseou-se nas provas e indícios colhidos pelas investigações, que apontaram práticas de compra de votos e assédio eleitoral criminoso. Entre outras, Píton fez uma transferência de R$ 2 mil via PIX para uma eleitora, cobrando os votos dela e de três familiares. A negociação foi registrada em mensagens trocadas por aplicativo de celular, nas quais a eleitora e o candidato discutem o valor do pagamento. A sentença foi publicada em 12 de fevereiro deste ano.

No caso de Campo Grande, além das conversas por celular rastreadas e dos comprovantes das transações, as investigações reuniram outras peças incriminatórias, apontando a veracidade da ação criminosa que foi empreendida para angariar votos visando à reeleição de Adriane. Tanto é que Mantovani menciona, objetivamente, abusos de poder econômico e de autoridade — com viés religioso e político — para a “captação ilícita” de sufrágio.

O elenco das transgressões ressaltadas pelo procurador do MPE inclui: “promover ostensiva campanha eleitoral no interior de templos e em cultos religiosos, notadamente, junto à Assembleia de Deus Missões; operar uma rede de apoio/influência eleitoral com a ajuda de pastores da ADM, os quais atuaram como verdadeiros cabos eleitorais junto às suas comunidades eclesiásticas; cooptar tais líderes religiosos mediante nomeações em cargos públicos e políticos na prefeitura de Campo Grande/MS; realizar, mediante a simulação de evento de lideranças femininas (o evento ‘Mulheres que Transformam’), grandioso e luxuoso comício eleitoral na sede da Igreja Aliançados, com pedidos expressos de votos e com a presença de figuras de projeção nacional na política; disseminar, por meio do ecossistema de desinformação criado para beneficiar as investigadas, imagens, vídeos e mensagens com a tônica do ‘bem versus mal’, sempre associando sua adversária Rose Modesto ao mal e colocando-se como representantes do bem”.

HISTÓRICO

A conclusão do MPE sobre a “operação reeleição”, liderada por Adriane Lopes, leva em consideração todo o “conjunto da obra” que a prefeita vem executando na contramão dos preceitos republicanos desde sua posse, em abril de 2022.

Neste conjunto de tropeços, encontram-se ainda o calote nas empresas responsáveis pelos serviços de tapa-buracos, deixando a cidade cheia de crateras e as ruas intransitáveis; desobediência às leis e resistência à determinação do Judiciário para pagar adicionais de insalubridade aos servidores; adoção de uma “folha secreta” para manusear o dinheiro público às escondidas, sem divulgar as finalidades; suspensão dos repasses de auxílio financeiro mensal à Santa Casa e outros hospitais; e o estelionato eleitoral de obras prometidas e não realizadas, como o Hospital Municipal e o Centro de Belas Artes.