Anunciado com entusiasmo pela prefeita de Campo Grande, Adriane Lopes (PP), o pacote de R$ 134 milhões para modernização da Rede Municipal de Ensino (REME) virou manchete e encheu os olhos de quem espera por melhorias urgentes na educação.

A promessa inclui instalação de painéis solares, reformas estruturais e, principalmente, a tão esperada climatização das salas de aula com ar-condicionado em todas as unidades da rede pública municipal. No entanto, uma questão incômoda paira no ar — assim como o calor que ainda predomina nas salas de aula: de onde saíram esses equipamentos anunciados, se não há registro da compra no Diário Oficial ou no Portal da Transparência?

A reportagem consultou os três principais anúncios feitos nos últimos meses — veiculados pelos portais Campo Grande News e Midiamax — e buscou confirmar, nos canais oficiais da Prefeitura, a existência dos contratos, licitações ou qualquer movimentação orçamentária que comprovasse a aquisição dos aparelhos. Resultado? Nenhum documento encontrado.

ANÚNCIO SEM LASTRO OFICIAL

O anúncio mais recente, publicado no dia 5 de abril, crava: “Escolas da REME terão energia solar e ar-condicionado, anuncia prefeita.” A informação foi dada como fato consumado, com direito a data de início da entrega dos aparelhos: 1º de junho.

Entretanto, uma busca detalhada nos Diários Oficiais do Município e do Estado, além do Portal da Transparência de Campo Grande, não encontrou sequer menção à compra dos equipamentos. Tampouco há detalhamento sobre qual fatia dos R$ 134 milhões será de fato destinada aos aparelhos de ar-condicionado — ou se há algum cronograma físico-financeiro já em andamento.

É, no mínimo, preocupante que uma ação de grande impacto financeiro e estrutural, amplamente divulgada à população, não possua lastro documental visível. A ausência de registros oficiais levanta dúvidas sobre o processo administrativo por trás da iniciativa — se é que ele existe.

PERGUNTAS QUE NÃO QUEREM CALAR

Diante disso, na quinta-feira (10.abr.25), a reportagem encaminhou e-mail à Prefeitura de Campo Grande e ao secretário de Educação, Lucas Bitencourt, com uma série de perguntas objetivas. Eis:

  • Qual a quantidade de aparelhos adquiridos?
  • A compra faz parte de qual programa?
  • De onde vieram os recursos — Tesouro Municipal, Governo Estadual, emenda parlamentar?
  • Onde estão armazenados os equipamentos?
  • Onde estão os documentos de licitação, contrato ou homologação?

Entretanto, até a publicação desta matéria, nenhuma resposta foi enviada pela administração municipal.

TENSÃO SOB MÁ ADMINISTRAÇÃO

A gestão Adriane Lopes atravessa um momento de desgaste severo. Buracos nas ruas se multiplicam, obras são interrompidas, empreiteiras denunciam calotes, políticas sociais e culturais estão desmanteladas. A cidade está estagnada — e o cofre, vazio.

Internamente, a Prefeitura enfrenta denúncias de atrasos em repasses, salários e suspeitas de pedaladas fiscais. Ao mesmo tempo, a chapa de Adriane é alvo de investigação por compra de votos nas eleições de 2024, com denúncia já oferecida pelo Ministério Público Eleitoral (MPE).

MAIS FUMAÇA QUE VENTO FRESCO

Nesse cenário, anunciar um investimento milionário e imediato sem apresentar a origem dos recursos, os trâmites legais ou qualquer documento que comprove a existência dos bens não só levanta dúvidas — escancara uma tentativa de construir uma cortina de fumaça em uma gestão fragilizada.

A prefeita faz um movimento conhecido de políticos sob pressão: prometer uma cidade climatizada enquanto a população sente na pele — e no bolso — os efeitos do abandono.

Transparência pública não é opcional, é obrigação. E, no caso dos ar-condicionados da REME, o que se vê até agora é um vento quente de marketing em meio ao mormaço de uma administração que perdeu o rumo.

Enquanto isso, alunos seguem suando nas salas de aula e cidadãos seguem esperando respostas. Porque prometer é fácil — difícil mesmo é explicar onde está o dinheiro.